
O governo de Minas Gerais revogou nesta semana a Portaria nº 123/2024, que impedia a aplicação imediata da Lei Estadual 25.070/2024. A norma, de autoria do deputado Ricardo Campos (PT), garante que motoristas com IPVA e outras taxas em atraso possam quitar seus débitos no momento da abordagem em blitz, evitando a apreensão do veículo.
Apesar de ter sido sancionada ainda em 2024, a legislação vinha sendo ignorada pelo Executivo estadual, que orientava a Polícia Militar a rebocar veículos mesmo quando o condutor demonstrava intenção de quitar a dívida no ato. A justificativa oficial era a necessidade de regulamentação — argumento derrubado agora com a revogação da portaria.
“Máfia do guincho” e repressão a trabalhadores
O deputado Ricardo Campos denunciou o que classificou como uma verdadeira “máfia do guincho” operando com respaldo institucional. “Centenas de motoristas tiveram seus carros levados mesmo querendo pagar na hora. A indústria do guincho, os pátios de apreensão e a máfia da multa lucraram com o sofrimento do povo”, afirmou.
Campos convocou uma audiência pública na Assembleia Legislativa de Minas Gerais para debater os abusos cometidos pelas forças policiais e os impactos sociais da medida. Segundo ele, a prática afetava principalmente trabalhadores de baixa renda e moradores de zonas rurais, que usam o carro como ferramenta essencial para se locomover.
Dívida de IPVA não justifica apreensão sumária
O parlamentar reforça que o IPVA é uma dívida de natureza tributária, o que impede, legalmente, a apreensão imediata do bem sem o devido processo legal. “O que tem sido feito pela Polícia Militar, sob comando do governador, é ilegal: apreender veículos de trabalhadores que tentam chegar à sede do município para trabalhar”, afirmou.
A nova lei também determina que, uma vez feito o pagamento, o nome e CPF do proprietário devem ser imediatamente retirados dos órgãos de proteção ao crédito, como Serasa e SPC — livrando o cidadão de protestos e bloqueios por dívida que foi regularizada no momento da abordagem.
Multas, cartório e o peso da inadimplência
Antes da vigência da nova lei, motoristas inadimplentes enfrentavam uma série de obstáculos para regularizar a situação. Além de juros e multas, as cobranças envolviam taxas cartoriais que podiam chegar a R$ 500 ou mais. “Um trabalhador que fica seis meses sem pagar o IPVA não só tem que arcar com o dobro da dívida, como ainda paga para tirar seu nome do protesto”, denunciou Campos.
Agora, com a portaria suspensa, a expectativa é que a Polícia Militar passe a respeitar integralmente a nova legislação e permita a regularização no ato da blitz — medida que já é adotada em outros estados como São Paulo e Espírito Santo.
Minas lidera ranking de apreensões no país
Segundo um estudo da Unicamp, entre janeiro de 2024 e dezembro foram 197.392 veículos apreendidos por falta de licenciamento no Brasil, sendo o atraso no IPVA a principal causa. Minas Gerais liderou o ranking nacional nesse período.
Esses dados ajudam a dimensionar o impacto social da medida. Enquanto muitos motoristas tentavam quitar suas dívidas, a manutenção da portaria resultou na apreensão de milhares de veículos — gerando lucros para empresas de remoção e pátios, e prejuízos irrecuperáveis para famílias de baixa renda.
Indústria da remoção movimenta milhões com IPVA atrasado
Estima-se que o custo médio para liberação de um veículo apreendido por IPVA em atraso varie entre R$ 500 e R$ 800, somando guincho, diárias em pátios e taxas administrativas. Com mais de 190 mil apreensões em dois anos, o setor da remoção e guarda veicular pode ter movimentado cifras superiores a R$ 100 milhões no período — valor que, em muitos casos, foi retirado diretamente do bolso do trabalhador inadimplente.
A Secretaria de Estado da Fazenda (SEF-MG) estima que até junho de havia 3,21 milhões de veículos com IPVA atrasado — ou seja, 28,36% da frota tributável. Mesmo com a inadimplência, o Estado arrecadou R$ 8,83 bilhões dos R$ 10,87 bilhões previstos para o ano, atingindo 81,2% da meta.
Nova lei é vitória da pressão popular
Com a revogação da portaria, o Estado passa a cumprir a legislação aprovada. Para o deputado Ricardo Campos, a decisão representa uma conquista dos cidadãos contra a arbitrariedade institucional. “Essa é uma vitória do povo de Minas Gerais. O Estado não pode lucrar com a desgraça do trabalhador. Agora, quem quiser pagar o IPVA na hora, poderá fazê-lo — sem guincho, sem abuso, sem humilhação”, concluiu