Rodrigo Lopes

Dono do Master foi denunciado por gestão fraudulenta em 2021

Investigação da CVM revela operações fraudulentas ligadas ao banco há 4 anos, envolvendo a família Vorcaro e um rombo bilionário

Daniel Vorcaro
Foto: Rede social
Daniel Vorcaro


Preso na segunda-feira (17), o dono do Banco Master, Daniel Vorcaro, e seu pai, Henrique Vorcaro, são investigados por operações consideradas fraudulentas no mercado de capitais desde 2021. As apurações tiveram início após a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) identificar indícios de irregularidades na 3ª emissão de cotas do fundo Brazil Realty FII, que envolvia o Banco Máxima — antigo nome do Master — e outros familiares do banqueiro, incluindo o primo Felipe Vorcaro .

Documentos analisados pela CVM apontam operações incompatíveis com as normas do mercado, movimentações atípicas e possível manipulação no processo de captação do fundo imobiliário. A proposta de Termo de Compromisso apresentada pelos investigados foi rejeitada pelo órgão regulador em 2022, o que reforçou a gravidade das suspeitas e manteve o processo administrativo em andamento.

A situação ganhou novo capítulo neste ano. Em abril, o Portal iG publicou, com exclusividade, detalhes da investigação e dos desdobramentos que cercavam a atuação de Vorcaro no mercado financeiro, destacando que as apurações já se estendiam por mais de dois anos. À época, o Banco Master tentava viabilizar a venda da instituição para o Banco de Brasília (BRB) por R$ 2 bilhões — operação que seria posteriormente vetada pelo Banco Central.

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A prisão de Daniel Vorcaro, agora inserida em um contexto ainda mais amplo de suspeitas sobre créditos sem lastro, liquidação do Master e tentativas de fuga em jatinho particular, conecta-se diretamente à linha investigativa iniciada em 2021. Para autoridades envolvidas no caso, o histórico de irregularidades no mercado de capitais pode ajudar a explicar como o rombo bilionário do banco foi construído e quem participou das operações consideradas fraudulentas.

Daniel Vorcaro, além de sócio da SAF do Atlético Mineiro, também administra um dos fundos de investimento ligados ao clube. O nome do banqueiro aparece ainda em outra frente sensível: ele é alvo de suspeitas envolvendo o possível recebimento R$ 300 milhões de recursos provenientes da organização criminosa PCC, segundo apurações em curso nas esferas federal e estadual.

As atividades de Vorcaro no setor esportivo e no mercado financeiro se misturam a uma série de negócios paralelos. Em 2023, ao lado de outros sócios, ele adquiriu a mineradora Itaminas, localizada na Região Metropolitana de Belo Horizonte. A empresa pertencia anteriormente à família de Cristiano Paz, operador do mensalão no governo Lula e figura central no esquema de Marcos Valério.

Os envolvidos e a acusação

O processo, a que o  iG teve acesso, envolve nove suspeitas, incluindo pessoas físicas e instituições financeiras. Entre os principais envolvidos estão: Antônio Carlos Freixo Júnior, Daniel Bueno Vorcaro, Felipe Cancado Vorcaro, Henrique Moura Vorcaro, Banco Máxima S.A., Entre Investimentos e Participações Ltda., Milo Investimentos S.A., MG I Desenvolvimento Imobiliário SPE Ltda., e Viking Participações Ltda.

A acusação aponta para a realização de operações fraudulentas, configurando infração à Instrução CVM 08/79. Essas infrações, segundo a investigação, envolvem manipulação no mercado secundário e uso de ativos questionáveis na integralização do fundo.

 Com o intuito de encerrar o caso sem uma admissão formal de culpa (evitar denúncia criminal), os envolvidos propuseram à CVM o pagamento de R$ 3 milhões, distribuídos entre as partes envolvidas.

A proposta de Termo de Compromisso previa, entre outras coisas, o pagamento de valores individuais para cada um dos acusados e o compromisso de elaborar um novo laudo de avaliação dos ativos utilizados na integralização das cotas do fundo.

A proposta de acordo foi dividida da seguinte maneira:

Antônio Carlos Freixo Júnior: R$ 200 mil
Entre Investimentos: R$ 300 mil
Banco Máxima, Daniel Vorcaro e Viking Participações: R$ 1 milhão
Milo Investimentos, MG I SPE, Henrique Vorcaro e Felipe Vorcaro: R$ 1,5 milhão

Além disso, os envolvidos se comprometeriam a contratar um avaliador escolhido pela CVM para revisar os ativos usados na integralização das cotas do fundo.

Caso o novo laudo indicasse um valor inferior ao inicialmente utilizado, os envolvidos se comprometeriam a complementar a diferença em dinheiro.

A rejeição da proposta pela CVM

Contudo, o Comitê de Termo de Compromisso da CVM, acompanhado pelo parecer da Procuradoria Federal Especializada, rejeitou a proposta, considerando que as infrações cometidas eram de extrema gravidade.

A rejeição foi fundamentada na complexidade e nas graves implicações do caso, que envolvem possíveis manipulações no mercado secundário e o uso de ativos que poderiam ter sido superfaturados para integralizar o fundo.

De acordo com a Superintendência de Registro de Valores Mobiliários (SRE), as investigações revelaram que todas as empresas envolvidas no Brazil Realty FII estavam de alguma forma conectadas a cotistas do fundo. Esse fator foi visto como agravante, pois sugeria que as operações poderiam ter sido utilizadas para transferir recursos entre os envolvidos de maneira irregular.

A Procuradoria Federal Especializada também destacou que o valor proposto para o acordo era insuficiente e não compensava os danos causados aos investidores, que sofreram um prejuízo estimado em R$ 5,8 milhões.

Irregularidades apontadas pela CVM

As investigações realizadas pela CVM também revelaram uma série de irregularidades graves na emissão das cotas e na avaliação dos ativos do Brazil Realty FII, tais como:

*Descumprimento da ICVM 476 (Oferta Pública de Cotas): A administradora do fundo, I.I.D.T.V.M.L, não cumpriu diversas exigências previstas pela CVM, incluindo a falta de informações claras e suficientes para os investidores. A oferta foi realizada sem comprovar que foi solicitada por cotistas, e alguns investidores não eram cotistas do fundo, o que fere as regras da oferta restrita.

*Avaliação Fraudulenta de Ativos: Foi identificado que a MILO Investimentos, uma das empresas envolvidas, utilizou um laudo de avaliação de ativos questionável para integralizar cotas no valor de R$ 70 milhões. O laudo apresentou inconsistências, como uma avaliação superfaturada de R$ 56 milhões em um imóvel e ausência de assinatura do avaliador.

*Manipulação no Mercado Secundário: A CVM também identificou que a I.I.D.T.V.M.L e a Entre Investimentos facilitaram operações fraudulentas no mercado secundário, criando uma liquidez artificial para as cotas do fundo, o que prejudicou diversos investidores, incluindo fundos de previdência.

Em nota, Antonio Carlos Freixo Junior e a Entre Investimentos e Participações Ltda. informam que, embora nenhuma responsabilidade tenha sido atribuída a eles no processo em questão, decidiram apresentar propostas de acordo para encerrar o caso de forma definitiva. Segundo a nota, as propostas foram consideradas adequadas pelo Comitê de Termo de Compromisso (CTC) da CVM. A decisão final do colegiado começou a ser analisada em 17/12/2024 e está, desde então, com o relator, que pediu mais tempo para concluir a avaliação e dar a palavra final.