Ciro e Carlos Lupi
Carta capital
Ciro e Carlos Lupi


A saída de Carlos Lupi do Ministério da Previdência Social vai muito além de uma simples troca de comando. O episódio revela movimentações subterrâneas com potencial de reconfigurar o campo progressista e criar fissuras na base aliada do governo Lula.

Em meio a esse rearranjo, ressurge o nome de Ciro Gomes (PDT) — ex-governador do Ceará, quatro vezes candidato à Presidência e eterno desafeto do PT — como peça-chave em um novo ciclo de instabilidade e disputa por espaço político.

Coincidência ou ensaio de reconciliação

Curiosamente, a queda de Lupi coincide com um movimento ainda embrionário de reaproximação entre Ciro e seu irmão, o senador Cid Gomes (PSB), após um dos rompimentos mais emblemáticos da política cearense.

Em evento do PSB, Cid declarou publicamente que não pretende se posicionar contra o irmão no plano nacional. A fala, ainda que protocolar, foi suficiente para acender o alerta em setores do PDT e do governo.

Um Ciro fortalecido, com base no Ceará e livre de amarras ministeriais em Brasília, é tudo o que o Planalto não quer enfrentar num cenário já repleto de incertezas para 2026.

O PDT em xeque: crise interna e disputa por rumos

A saída de Lupi, ainda que oficialmente motivada por desdobramentos de uma operação da Polícia Federal — na qual ele sequer foi formalmente investigado —, escancarou a fragilidade do PDT.

Com apenas 17 deputados federais e desempenho eleitoral decepcionante nas últimas disputas, o partido caminha para um ponto de inflexão: ou se consolida como legenda auxiliar da base lulista, ou aposta no rompimento e na reconfiguração liderada por Ciro.


Setores ligados ao ex-governador enxergam na crise uma janela de oportunidade. Com Bolsonaro inelegível e a direita buscando um novo nome viável, Ciro poderia emergir como alternativa “nacionalista” e “anti-establishment”, mesmo que sua retórica frequentemente soe mais conservadora do que progressista.

Seu discurso anti-PT, com verniz moralista e antipolítico, pode atrair parte do eleitorado órfão do bolsonarismo, mas com reservas ao extremismo. A narrativa midiática e o simbolismo da queda de Lupi

Para o Planalto, a demissão tornou-se um ato simbólico: o início de uma operação para enfraquecer a base governista, abrir espaço para atores de centro-direita e forçar o PDT a sair de cima do muro.

A nomeação do ex-deputado Wolney Queiroz para o lugar de Lupi foi uma tentativa de contenção de danos — mas pode não ser suficiente para segurar a legenda na órbita governista.

Ciro Gomes: o eterno outsider no jogo das elites

Ciro, mesmo com derrotas sucessivas, conserva capital político. Sua capacidade de atingir dois dígitos em pesquisas de primeiro turno ainda é vista com interesse por setores que desejam fragmentar a esquerda e evitar a polarização direta entre Lula e um nome mais palatável à direita, como Tarcísio de Freitas (Republicanos) , Romeu Zema (Novo) e Ronaldo Caiado (União), governadores de São Paulo, Minas Gerais e Goiás, respectivamente.

A candidatura de Ciro em 2026 pode não ter como objetivo real a vitória, mas sim o enfraquecimento de Lula — abrindo caminho para a direita chegar ao segundo turno com mais chances. O ex-ministro teria, assim, papel funcional na engrenagem eleitoral, mesmo mantendo a fachada de oposição de esquerda.

O futuro incerto do PDT

Internamente, o PDT vive uma disputa de narrativa e sobrevivência. De um lado, estão os governistas, que apostam na aliança com Lula para manter espaços, verbas e visibilidade institucional.

Do outro, os ciristas, que veem no rompimento uma última cartada para manter Ciro em evidência e tentar reconstruir a identidade do partido como força independente.

O risco é duplo: se romper, o PDT pode tornar-se um satélite irrelevante, sem base social ou apoio robusto no Congresso. Se permanecer no governo, pode implodir por dentro, com a militância mais ideológica debandando ou sendo absorvida por siglas como PSOL, PSB e Rede.

O tabuleiro já está em movimento

A saída de Carlos Lupi não foi apenas um ajuste pontual no ministério. Ela foi o gatilho de uma reconfiguração mais ampla — uma operação que envolve mídia, partidos, lideranças regionais e estratégias eleitorais para 2026.

O PDT, mergulhado em crise e ameaçado pela cláusula de barreira, virou território em disputa. E Ciro Gomes, mais uma vez, ensaia seu retorno ao palco — não como protagonista óbvio, mas como vetor de instabilidade num tabuleiro que, aparentemente, já começou a ser mexido.



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